sábado, 29 de maio de 2010

Protagonistas do Planalto

Ser ou não ser? Os políticos já estão em ensaio aberto ao público (o eleitor) há meses...

A atriz Fernanda Torres estreou hoje, na Folha de S. Paulo, coluna sobre eleições na editoria de Política (hoje substituída como Poder). Seu primeiro (e excelente) artigo é um alento às discussões vazias sobre o jogo eleitoral que se desenha há alguns meses nesse período, que oficialmente é chamado de 'pré-candidatura', mas que em linhas pratícas já é campanha aberta, descarada mesmo. Dilma Rousseff, José Serra e Marina Silva protagonizam seus devidos papeis em cena. Com gafes e situações vexatórias que, como todo ser humano, ou como um ator, no exemplo de Fernanda, pode desencarnar Macbeth ao toque de um celular. É uma leitura obrigatória, tanto para os que apreciam o tema como para os que, levianamente ou professoralmente, esmeram-se em profanar sobre 'despreparo', 'insegurança' ou 'timidez'. Deleite-se!

Eleições: o dom de iludir

O candidato é um ator em eterno teste; uma condição vexatória e desconfortável



O QUE LEVA alguém a se candidatar à Presidência? A ser tão bisbilhotado, ofendido, pesquisado e aviltado? Que papel grandioso é esse cujo ensaio, estreia e temporada custam o fígado do próprio intérprete?
A política é um palco letal, o Coliseu romano da atualidade. Um lugar de ódios milenares, mágoas irreparáveis, conciliações imperdoáveis e, também, do temível ridículo. Eu seria incapaz de atuar sob tamanha pressão.
Não se trata apenas de dar conta de Rei Lear: tem que voar no jatinho, fazer a carreata, comer dobradinha, andar de mula e enfrentar a tempestade do Crato ao Pampa gritando "Uiva vento!" pelos palanques.
Tem que ter sangue de barata, paciência de Jó, cara de pau e vontade de elefante.
Outro dia me mandaram um link na internet onde a Dilma Rousseff se embananava toda para responder a uma simples questão: "Que livro a senhora está lendo?"
Qualquer um que cultive o prazer de ler sabe que um ser humano que está em plena campanha presidencial não tem cabeça nem tempo para se dedicar à leitura.
Talvez a "Arte da Guerra", de Sun Tzu, entre um programa do Ratinho e outro, seja o único exemplar que resista ao tranco, por seu conteúdo bélico de autoajuda milenar.
Mas admitir que não está lendo porcaria nenhuma é encarar as manchetes do dia seguinte afirmando que fulano, ou fulana de tal, é um energúmeno, um(a) ignorante não afeito às letras.
Por isso Dilma se contorce, tentando se lembrar do último livro que leu, o que só consegue com a ajuda dos assessores. A duras penas acerta o título e a mais duras ainda arrisca um resumo dele. A pergunta corriqueira, quem diria, a colocou em um mato sem cachorro.
Se a tivessem arguido a respeito da política de juros, da dívida pública ou até mesmo de um espinhoso tema como o aborto, ela estaria apta a responder. Bastou uma perguntinha pessoal para que Dilma se afastasse brechtianamente da ciranda da candidata e caísse em si mesma, perdendo o fio do personagem.
O candidato é um ator em eterno teste. Uma condição vexatória e terrivelmente desconfortável.
José Serra escolheu o perfil do conciliador boa-praça, se manteve bem no personagem até que perdeu a paciência na rádio CBN diante da prensa de Míriam Leitão. Míriam, aliás, tem sido dos ossos mais duros de roer para os que estão na corrida presidencial.
Serra soltou um desabafo irritado a respeito do que pensava da relação entre a Presidência e o Banco Central. Depois, teve que remar forte para recuperar a imagem que passou semanas construindo, justificando de forma sincera que o horário matutino lhe havia puxado o tapete.
Qualquer razão idiota, como pular da cama cedo, pode colocar tudo a perder; da mesma forma que um celular que toca no meio de um espetáculo pode fazer Macbeth desencarnar de vez da alma de um ator.
A verdade e a franqueza são armas de destruição em massa na política, é necessário saber ocultá-las com desenvoltura e, muitíssimas vezes, mentir com convicção.
Marina Silva não titubeia, ela é a terceira via, pode dizer o que pensa. Apesar de ter sido ministra, ela não passa pelo comprometimento político dos dois outros adversários, pertencentes a partidos que já ocuparam o Planalto e fizeram alianças muitas vezes incompreensíveis para poder governar.
Marina está dentro e fora do jogo, uma posição importante e confortável.
Glorinha Beautmüller, fonoaudióloga e preparadora vocal de inúmeros atores e políticos, é uma figura lendária, dona de intuição aguçada, métodos nada ortodoxos e técnica que visa ancorar a palavra ao corpo e aos sentidos do palestrante.
Profissional ímpar, ela já botou de quatro modelos com ambições a atriz, para que perdessem a pose enquanto recitavam um texto, e aconselhou com veemência que Cláudia Jimenez falasse pela vagina na sua estreia no teatro profissional como uma das prostitutas de "A Ópera do Malandro". Ao que Claudia, com seu talento e humor de sempre, respondeu, aplicada: "Eu estou tentando, Glorinha, estou tentando!"
Uma vez, a maga foi chamada às pressas a Brasília para atender um político repentinamente afônico e necessitado de discursar. Segura, não pestanejou no diagnóstico: "Meu filho, você está rouco desse jeito porque você mente demais!"
Hoje, o político ideal deve reunir o carisma de Sílvio Santos, a classe de Paulo Autran, a astúcia de Alexandre, o Grande, a retórica de Ruy Barbosa, o empreendedorismo de Antônio Ermírio, a responsabilidade do doutor Paulo Niemeyer, o desapego de Buda, a razão de Confúcio, a bondade de Cristo e ainda sair vivo da arena quando soltarem os leões famintos atrás da sua carne. Essa pessoa não existe. O político, portanto, tem que ter o dom de iludir.

*texto de Fernanda Torres, publicado hoje (29/5/2010) na Folha de São Paulo.

domingo, 23 de maio de 2010

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Esse vídeo é porque achei o caso surreal e porque sou muito, muito mesmo, contrário a todo esse movimento de rodeio e touradas.

sábado, 15 de maio de 2010

pensamento do dia

"Quando duas pessoas não estão de acordo, o melhor é que cada um se safe para o seu lado. De longe, a sangue frio, trata-se tudo melhor. Cara a cara, palavra puxa palavra, vai tudo por água abaixo..." -

Eça de Queirós -

terça-feira, 11 de maio de 2010

Mineirices


Porque na última sexta eu e Jana, minha hermana do Rio, cantamos a valer isso na mesa do bar, como se estivéssemos assim, tipo, num botequim de Ouro Preto, Tiradentes ou BH, uai. No melhor estilo Clube da Esquina...

Madrugadas alcoólicas


Olha, a vida não está fácil. Meu fígado que o diga. A semana passada foi de muita intensidade. Na quarta, jogo com clima de final da Libertadores e Corinthians eliminado. (Eu, confesso, até fiquei triste com toda a comoção desse bando de loucos). Litros e litros de cerveja na casa do corintiano Dani People, cercado de mais duas corintianas. Do clima de expectativa, ao ápice da vitória e o desconsolo da eliminação foram pelo menos dez, doze latas. Quinta, dia de reencontro de amigos cariocas na Cidade Maravilhosa. Da botecagem no Salvação, em Bota, ao Cinemathéque, ali pertinho, foram quase oito horas de embriaguez. E sexta? Dia de curar a ressaca? Nada. Cervejinha na casa do Lipe, seguido de vários copos de cerveja até 5h num botequim fuleiro também em Bota até depois das 5...
Bom, então sábado UTI, certo? Tsc, tsc. A gente fica na bodice, mas ataca com cerveja. Uma tentativa frustrada de ir ao Astor carioca depois, seguimos para o Bar D'Hotel, no Leblon, fazer o rico e tomar drinques e appetizers. Sabe aqueles petiscos finos? Pois estavam deliciosos - e combinaram bem com algumas doses de uísque, até... 5 da manhã, sempre. Domingo, São Pedro quis que eu ficasse na cama até o hoário do voo - nada de querer rebater tudo isso com a saideirinha no Coqueirão, não. Aí, eu obedeci, segui direitinho pro Santos Dumont. Mas não resisti a uns chopinhos no almoço das mães. Afinal, não sou de ferro. Meu óleo chama-se álcool - e não é higienizador.

De encher os olhos - e ouvidos


Vi com muito, muito atraso o vencedor do Oscar de melhor filme estrangeiro 'O Segredo dos Seus Olhos'. E fiquei impressionadíssimo com a qualidade do cinema do argentino Juan José Campanella (o mesmo de 'O Filho da Noiva'). Em algumas críticas anteriores, li que o filme era longo e poderia cansar. Sério, isso é impossível. Como é impossível não se entregar à trama de Benjamin Espósito (o excelente Ricardo Darín) e sua fixação em encontrar o assassino de uma jovem moça, incentivado pelo marido dela - que não quer vingança com a própria vida, apenas a prisão perpétua do culpado (ou suspeito?).
Há muito a falar das virtudes de O Segredo. Mas me atenho a duas. A primeira é um dos mais incríveis, belos e angustiantes plano-sequência que já vi - que começa numa cena aérea num estádio de futebol lotado e segue numa angustiante perseguição. Outra está nos elementos, sempre dosados de forma muito inteligente, que formam uma boa história: humor (excelente Pablo Sandoval), suspense e romance.
É um deleite aos olhos e ouvidos. É cinema como há muito tempo não via. De arrepiar os corações mais brutos... E o que dizer de um diálogo como esse: "Não se pode pensar tanto assim (na vida), se não você vive mil passados e nenhum futuro". Simplesmente arrebatador.

segunda-feira, 3 de maio de 2010

Simples, belo e adolescente


Quem aqui nunca fez (ou foi alvo de) fofoca na escola? Quem não lembra daquela que fez a farra sexual de todos os caras do ginásio e do colegial? Ou quem não teve a primeira paixonite adolescente ou aguentou calado (no máximo compartilhou com aquele amigo que você jurou que seria pra vida toda) uma crise familiar? E que atire a primeira pedra quem nunca viu um cigarro de maconha (o baseado) sendo enrolado e fumado no recreio ou na saída. O roteiro pouco muda desde que criaram-se os primeiros muros da escola.
Ser adolescente e achar que está virando adulto é quase sempre recheado com os mesmos ingredientes. É que nem receita, com um ingrediente a mais ou a menos e uma outra forma de preparo. É por isso que Laís Bodanzky (de 'Bicho de Sete Cabeças' e 'Chega de Saudade') tem comovido tanta gente por aí. Porque fala para todas as idades, seja quem está vivendo, seja quem hoje vive o sabor da nostalgia.
Os dramas adolescentes estão todos lá, com aquela intensidade de quando você tem 15 anos e já acha que ser adulto é, de fato, foda (porque, afinal, você já acha que é um, principalmente nas argumentações com seus pais. Aquela necessidade de afirmar que agora é 'de igual para igual'). As histórias estão ali, situadas no mundo de hoje - com a intensa comunicação pelo celular e com uma personagem que registra todos os acontecimentos da escola (todos, mesmo!) no blog.
O elenco é outra escolha feliz de sua diretora, em que se destaca Francisco Miguez, em contraponto a Fiuk (o filho de Fábio Jr.), que pouco acrescenta em cena, apesar de seu personagem permitir isso - ele é carregado de problemas psicológicos; está em depressão. Rasteiras e superações; descobrimentos e frustrações; festinhas e brigas; a primeira vez e o não.
Esses sentimentos ambíguos são levados às telas de forma que é impossível compartilhar da mesma sensação de um dos protagonistas. "Não é impossível ser feliz depois que a gente cresce. Só é mais complicado."