sábado, 30 de maio de 2009

poder das palavras


Uma cadeira, um foco de luz e só. No figurino, uma calça social preta e uma camisa branca. O palco nu e os recursos minimalistas bastam para que Fernanda Montenegro prenda sua atenção do início ao fim. Desde sua atuação em 'Central do Brasil' (Walter Salles), quando ela arrematou o Urso de Ouro de melhor atriz e depois foi indicada ao Globo de Ouro e ao Oscar, Fernanda Montenegro já representava para mim a melhor atriz brasileira. Ontem, em 'Viver Sem Tempos Mortos', tive mais uma vez esta confirmação.
Sentada durante 60 min, ela apenas fala e se expressa, sem nenhum exagero, sem nenhum gesto mais dramático. Em mãos, tem 'apenas' a história da francesa Simone de Beavouir, uma das personalidades femininas mais importantes da história, e sua relação com Jean-Paul Sartre. Dois pensadores à frente do seu tempo, que pregaram a liberdade até o fim, sem limites. Juntos, se amaram e amaram tantos outros sem nunca esconder nada ao parceiro. Eram resguardados pelo pacto da verdade - e o cumpriam com rigor. Era o necessário para viver um amor sem mentiras e, sobretudo, profundo.
Com a delicadeza dos olhos e a empostação da voz minuciosamente medida, Fernanda Montenegro fala dos tantos homens que conheceu. E mesmo quando se entregou mais forte a outro homem, deixa claro que seu amor por Sartre pulsava mais alto. Mesmo que não quisesse demonstrar isso ao outro, fragilizava-se.
A história de Fernanda na vida real não foi bem assim. Durantes 60 anos de sua vida, esteve com Fernando Torres e foi feliz tendo apenas ele. Isso não é mérito, nem demérito. O fato é que, no palco, ela não deixa de fazer seu tributo ao parceiro que tanto amou. Por mais que tivesse conhecido outros homens, Fernanda, como Simone, não conseguiria se entregar mais do que a cama e um sentimento qualquer. Porque o coração sempre esteve atado àquele homem. O seu homem, a sua vida, a sua felicidade, como diz na peça.
A pior coisa foi perder Sartre (ou Fernando), diz Simone (ou Fernanda). Ainda assim, nem Fernanda nem Simone desejaram algum dia viver sem tempos mortos. A história e o teatro agradecem.
Só quem leva a verdade e a paixão pelo que faz consegue afirmar isso antes de qualquer homenagem póstuma. E sem qualquer recurso cênico. O mínimo, para Fernanda, basta.

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